Edson Brok é um caso de sucesso na fruticultura brasileira, que busca superar pela primeiras vez a marca de US$ 1 bilhões em exportações
*Publicada originalmente na edição 424 de Globo Rural (março 2021)
O convite de um grupo norte-americano para comandar um projeto de 500 hectares de fruticultura no Nordeste deu uma reviravolta na vida do paulistano Edson Brok, de 63 anos, que hoje é o maior exportador de bananas para o mercado europeu. A guinada ocorreu em 1999, quando Brok aceitou de pronto o desafio e perguntou quando saia o primeiro avião para embarcar. “Morar na praia e trabalhar no campo é tudo o que o paulista quer”, diz.
Na época, Brok trabalhava com logística de navios frigoríficos. Ele lembra que, ao chegar em casa e anunciar para a esposa e as duas filhas – na época com 13 e 4 anos – que fariam as malas para se mudarem definitivamente para o Nordeste, a reação foi de susto e muito choro. “Para dizer a verdade, a família não sabia nem onde ficava o Ceará no mapa. Foi uma choradeira tremenda, gerou um pânico inicial”, conta.
Anos depois, ele foi convidado a ser consultor de um projeto ainda mais ambicioso, de 3 mil hectares de frutas, de uma outra grande empresa que se instalava no Brasil. Em 2008, já adaptado à região e encantado com a bananicultura, Brok fez uma proposta para comprar uma fazenda de produção de bananas, que foi recusada. Três anos depois, conseguiu fechar o negócio. “No dia em que assinei o contrato, as pessoas não entendiam porque eu estava sorrindo, sozinho, dentro do metrô de São Paulo na hora do rush”, relembra.
Hoje, dono de uma fazenda com 300 hectares em Limoeiro do Norte (CE), a 200 quilômetros de Fortaleza, e detentor do título de maior exportador de bananas no Brasil para o mercado europeu, o paulistano nem pensa em voltar para a correria da maior metrópole do país.
No ano passado, o Ceará exportou mais de 19 mil toneladas de bananas para a Europa, das quais quase 12 mil toneladas saíram da fazenda de Brok. Com isso, a empresa fechou o ano com uma receita de mais de US$ 5 milhões.
A experiência bem-sucedida do produtor paulistano mostra o potencial da fruticultura brasileira, que em 2018 produziu 44,3 milhões de toneladas de frutas e exportou apenas 2,5% deste volume. A receita foi de US$ 848 milhões, segundo dados da Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frutas (Abrafrutas). O desafio neste ano é ultrapassar pela primeira vez a marca de US$ 1 bilhão em vendas para o exterior.
No ranking mundial, o Brasil é o terceiro maior produtor de frutas, perdendo apenas para a China e a Índia. No entanto, o país ocupa a 24ª posição entre os maiores exportadores, ficando atrás de países como Chile, Peru, Colômbia e Costa Rica.
Essa posição entre os maiores exportadores se justifica, em parte, pelo gigantesco mercado interno para frutas. “Diferentemente de outros países, que são orientados exclusivamente para exportação, o Brasil tem opções no seu mercado interno. Algumas fazendas de frutas foram concebidas para serem exportadoras, mas a maioria não foi estruturada para isso”, explica o presidente da Abrafrutas, Guilherme Coelho.
A fazenda de 300 hectares de Brok no Ceará foi concebida visando ao mercado exterior. Ele conta que a sua experiência profissional com logística foi fundamental para a eficiência na conquista dos mercados internacionais. “Exportar banana do Brasil para a Europa ou Estados Unidos requer aspectos muito particulares, especialmente quanto à localização dos pomares em relação ao porto de escoamento.”
Segundo ele, a exportação de banana para o mercado europeu, que é mais exigente do que o Mercosul, só é viável considerando o custo logístico. Não foi à toa a escolha da fazenda em Limoeiro do Norte, localizada a 220 quilômetros do Porto de Mucuripe (Fortaleza) e a 340 quilômetros do Porto de Natal (RN), por onde 100% da produção da empresa é escoada.
“Na distância em que estamos dos portos, o frete rodoviário sai a R$ 2.200 por contêiner. Quando se tem uma produção muito longe dos portos, de 900 quilômetros por exemplo, o custo vai para R$ 6.800. O produtor que quer exportar já sai com essa desvantagem de aproximadamente US$ 1 por caixa”, explica Brok.
Outro aspecto é o tempo de trânsito do navio: a diferença pode chegar a quatro dias a mais de viagem saindo de Salvador ou Recife, o que para frutas climatéricas (que continuam a amadurecer após a colheita), como é o caso da banana, é considerado “uma eternidade”. Por essa razão, com 500 mil hectares da fruta plantados no Brasil, os produtores das principais regiões do país, como Vale do Ribeira (SP) e norte de Minas Gerais, tendem a atender ao mercado interno ou aos vizinhos do Mercosul.
O controle fitossanitário é outro entrave para a abertura de fronteiras para frutas de outros países. A presença de patógenos e pragas nas frutas importadas por países onde não há ocorrência põe em risco toda a credibilidade do setor. Um exemplo é a sigatoka negra, a mais grave e temida doença da bananeira no mundo, causada pelo fungo Mycosphaerella fijiensis. A doença foi constatada no Brasil pela primeira vez em fevereiro de 1998, no Amazonas. Hoje, está presente em 11 Estados brasileitos. Estima-se que as perdas devido à doença têm variado de 70% nos plátanos a 100% nas variedades tipo prata e cavendish – sendo esta a variedade plantada na fazenda de Brok.
O passaporte de Brok para o mercado europeu é a certificação de organizações internacionais como Global G.A.P. e Rainforest Alliance. Ele se orgulha de não aplicar herbicida há mais de dois anos. Controla as plantas daninhas usando cobertura do solo com as folhas das bananeiras podadas e a roçagem é mecânica. Também faz-se o controle da sigatoka amarela e de tripes apenas eventualmente e evitando o uso de químicos.
Segundo Brok, o mercado brasileiro, que em teoria é menos exigente, também está caminhando para uma exigência maior. “Os produtores brasileiros terão de se capacitar melhor, ser mais saudáveis, ter rastreabilidade dos seus produtos, e isso vai ao encontro do que o cliente quer.”
Roberto Barcelos, diretor executivo da Abrafrutas, observa que a exportação de fruta fresca, diferentemente da industrializada, exige um rigoroso e elaborado plano de medidas mitigatórias para transporte, a fim de evitar o alto risco de introdução de pragas pela fruta. “E isso é feito de governo para governo, é um processo lento, burocrático e que exige muito investimento e diplomacia. Isso é o que os outros países acabam fazendo muito bem e deixando o Brasil para trás.”
Os acordos comerciais são outro desafio para a exportação das frutas. A banana brasileira que chega ao bloco europeu paga imposto de importação de € 114 por tonelada métrica, enquanto Peru, Colômbia e países da América Central, grandes produtores da fruta, assim como Costa Rica, Honduras, Guatemala e Nicarágua, pagam metade disso (€ 75 por tonelada).
Na opinião de Valeska de Oliveira, representante no Brasil da PMA (Produce Marketing Association, uma associação de produtos agrícolas frescos e de flores, fundada em 1949), o plano de expansão da fruticultura precisa ser construído como uma política independente do governo brasileiro. “Chile e Peru ganharam nos acordos bilaterais. Uma coisa é poder negociar com duas partes muito claras. O Mercosul talvez tenha segurado um pouco as negociações brasileiras.”
Nossos vizinhos sul-americanos como o Peru e o Chile no mesmo ritmo em que aprenderam a produzir frutas de alta qualidade souberam buscar e vender seus produtos para compradores internacionais. Em 2000, o Peru exportava cerca de US$ 100 milhões em frutas, enquanto o Brasil tinha uma receita cinco vezes maior. Há dez anos, o país andino também não tinha um pé de avocado plantado. Hoje, figura como o segundo maior exportador da América do Sul e, em 2019, a fruticultura gerou uma receita de US$ 3,3 bilhões ao país.
“Apesar de o mercado interno ser um grande consumidor, o Brasil está longe de acompanhar o ritmo de crescimento dos mercados internacionais como os seus vizinhos o fazem. Falta iniciativa privada, criar uma cultura exportadora para boa parte desse setor”, afirma Luiz Roberto Barcelos, diretor executivo da Abrafrutas.
Embora o mercado interno seja o principal destino, o brasileiro ainda está muito longe de atingir a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS). O consumo per capita anual deve ser de 140 quilos por habitante ao ano, mas o brasileiro consome, em média, 58 quilos por habitante ao ano.
Fonte: Revista Globo Rural